segunda-feira, junho 06, 2005

Postando uma mensagen do Dr. Fernando Botelho, da wirelesBR, sobre as "mudanças" nos pacotes de assinaturas... Interessantissimo pra quem quer entender principios juridicos e materia de um outro post sobre relacoes institucionais nas Value Clouds.

"Prezados,
Pela importância do fôro de debates e pela qualidade das manifestações quevão sendo a cada dia veiculadas nele, acho que uma opinião técnica poderáser útil na composição do cenário global desta questão (polêmica) daassinatura, até porque vários já se manifestaram quanto à repercussãoeconômica da eventual extinção da tarifa, e eu me rendo a elas para nãobuscar mais "lenha" para esse específico fôgo da discussão.A questão técnica, a que me refiro, é a de que o assunto relacionado com aalteração que se propõe hoje no Congresso (uma nova lei, que irá proibir acobrança de tarifa-assinatura, alterando, para isso, a redação do art. 103da LGT) causará uma alteração, significativa, na estrutura jurídica doscontratos (de concessão) que já foram firmados por prestadores de serviçosfixos e móveis de telefonia.Esses contratos, a exemplo dos contratos em geral firmados no país - quenós, da área jurídica, consideramos e nominamos "atos jurídicos perfeitos eacabados" - são protegidos pela Constituição Federal como elementosdefinitivos e, assim, infensos ao alcance de novas leis, por isso,insuscetíveis de alteração em sua estrutura obrigacional básica, por leisnovas.Razões de ordem política, ideológica, principiológica - que não cabe aquianalisar - determinam isso, isto é, que contratos firmados no país sejamcumpridos tal e qual celebrados, a despeito de novas leis que venham aalterar temas neles tratados.Dito de outra forma, lei nova, no Brasil, não pode retroagir, para alcançare alterar itens contratuais celebrados anteriormente a ela.Se o fizer, a lei nova passa a contrariar, antes, a própria ConstituiçãoFederal onde está protegido o princípio da intangibilidade do contrato (do"ato jurídico perfeito"), arriscando-se, por isso, a debates de suainconstitucionalidade, que, reconhecida, leva à sua inaplicabilidade (jáque, no Brasil, somente as leis constitucionalmente respaldadas podem seraplicadas).Contratos de concessão já firmados - entre o Poder Público (no caso, pelaANATEL) e empresas prestadoras de telefonia - o foram após intensosprocessos licitatórios (concorrência pública) que todos conhecemos e que,antes mesmo de instrumentos jurídicos, constituem parte da própria históriabrasileira de telecomunicações da era "pós-Telebrás".Essas licitações incluiram, dentre várias condições (ou, várias "regras dojogo" que propunham para a celebração dos correspondentes contratos), orecebimento, pelas contratantes-prestadoras, de determinadas tarifas, istoé, de preços públicos, compostos (ou seja, uma somatória de fraçõesremuneratórias claramente definida: tarifa-com medição + tarifa-sem medição)como forma de contraprestação pela absorção e prestação executiva dosserviços à população, pelas operadoras/contratantes.Esse tarifamento composto foi, em curtas palavras, amparado na disposição dalei que vigorava no momento da licitação (e que ainda vigora hoje - o art.103/LGT), expressamente inserido na oferta pública que foi feita dosserviços pelo Estado brasileiro através de licitações constantes de editaisde publicidade, e, finalmente, inserido em cada contrato celebrado, pelomesmo Estado, com asempresas vencedoras de cada processo licitatório.Estas tarifas são, por isso, cláusulas ou condições internas de cadacontrato, porque cláusulas e condições das próprias licitações e dos editaisque foram publicados.Alterar, agora, este sistema de tarifamento, isto é, fazê-lo posteriormenteàs licitações e aos contratos que foram celebrados e que estão hoje emexecução - seja para reduzi-lo, ou alargá-lo - equivalerá, antes de qualqueranálise econômica-financeira-atuarial, política, social, a modificação daestrutura interno-obrigacional-contraprestacional-remuneratória, de cadacontrato já celebrado pelo Estado brasileiro com cada operadora, com amodificação, consequente, das regras das licitações e dos editais quecontinham o sistema tarifário e que de modo algum propunham ou anunciavamextinção de item tarifário durante o prazo de cumprimento contratual.A lei nova irá, em suma, mudar a vertente anterior que o próprio Estadobrasileiro não só anunciou formalmente e legalmente como condição deconcessão dos serviços, mas praticou, contratualmente, com o mercado, emcada instrumento firmado.Esse, o primeiro ponto (técnico, insisto, da questão - da extinção datarifa-assinatura frente à Constituição Federal).O outro (ainda técnico-jurídico) é que, mesmo que se possa eventualmenteconsiderar constitucional e aplicável uma lei retroativamente modificativade contratos pré-firmados, não se poderá deixar de considerar que ela,assim, irá alterar substancial condição da contratação anterior (no caso, opreço público remuneratório dos serviços de telefonia já contratados).Se o fizer, atuará, então, sobre contratos pré-celebrados, e, neste ponto, ofará como a um "fato do príncipe" (usamos esta expressão em direitopúblico), isto é, como uma alteração unilateral do Estado brasileiro,portanto não-consensual, das regras contratadas, o que gera, também nostermos da Constituição e da própria lei nacional sobre licitações públicas,automático direito (do contratante atingido pela alteração) a mecanismocompensatório pela alteração, ao qual damos o nome de "re-equilíbrioeconômico-financeiro" de cada contrato alterado.Nouto modo de dizer, o contrato alterado por lei posterior terá de serlegalmente re-equilibrado e, se alterado quanto ao sistema de tarifamentonele contratado, isto é, quanto à remuneração contraprestacional docontratante, o re-equilíbrio terá de ser proporcional e também econômico emrelação a esta alteração.A questão resultará, aí, em saber como o Estado brasileiro, alterando oscontratos e tendo o dever de re-equilibrá-los juridica e economicamente, irácolher, de seus já suados orçamentos, recursos para quitação do que hojeequivaleria a algo em torno de 1/3 da receita operacional das prestadoras detelefonia, que será retirada do sistema tarifário que vigora atualmente.Vejam, então, que o risco de esse re-equilíbrio ser satisfeito através douso da própria recomposição tarifária, isto é, de reajuste da parcela queirá restar da própria tarifa pública (a tarifa-com medição), é grande, e, seo é, podemos antever uma intensa possibilidade de a luta por uma nova leiproibitiva da assinatura terminar desaguando, por via oblíquoa (e, insisto,por razão eminentemente jurídica), sobre o interesse dos própriosconsumidores, que, ao final, terão de suportar reajustes de re-equilíbrioeconômico-financeiro - e, não mais, de custeio apenas da operação - doscontratos alterados pela nova lei.Isto será, claro, uma decisão soberana da sociedade brasileira, através doCongresso, mas que precisa ter os item de legalidade também considerados e,quem sabe, aritmeticamente medidos, pois, tanto se poderá estar programandouma lei constitucionalmente inaplicável, quanto uma aplicável normamotivadora de novos reajustes tarifários compensatórios.

Abraços,Fernando Botelho"